No Dia do Índio, comunidade de Dourados lista reivindicações
Por Ariel Moreira Publicado 19 de abril de 2017 às 11:56

Um dia para ser lembrado que ainda existem indígenas no Brasil. Assim define indígenas da Reserva de Dourados sobre a data comemorativa ao Dia do Índio, celebrado hoje. Enquanto nas escolas de “gente branca” festinhas são realizadas com pintura no rosto, danças e histórias sobre a caça e a pesca, fantasia que perpetua na cabeça de quem não conhece a realidade do índio, comunidades pelo país afora têm a data de hoje como um dia histórico para lembrarem que ainda existem e resistem para sobreviver em sociedade.

A Reserva de Dourados foi criada há exato 100 anos pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), para confinar os povos da região e liberar na época terras da região para a colonização. São 3,5 mil hectares de terras e pouco mais de 15 mil indígenas das etnias Guarani, kaiowá e Terena vivem atualmente no espaço, considerado por eles como “confinamento”. A SPI não existe mais e foi substituída pela Funai (Fundação Nacional do Índio).

Na noite de anteontem, indígenas ocuparam a tribuna na sessão da Câmara Municipal de Dourados para listar uma série de reivindicações que são cobradas há muito tempo. Entra e sai prefeito, governador e presidente; muda-se gestor na Funai e a realidade social dos indígenas permanece. Muitas vezes piora. “Somos munícipes. Temos uma população de indígenas maior que 35 cidades sul-mato-grossenses. E não temos políticas públicas afirmativas voltadas para garantir melhorias à nossa comunidade”, lamentou em discurso o terena Fernando de Souza, da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

Fernando apresentou estatísticas feito pela própria comunidade que revela mais de 4 mil crianças fora do Ceim (Centro de Educação Infantil) e pouco mais de um mil do ensino básico. “Não há lei orçamentária para atender o povo indígena”, lastima o terena. O estudante universitário Tiago Aquino, do curso de direito da UEMS, declarou que a educação é um dos pilares para mudar a realidade indígena, mas isso não ocorre de forma integral.

“Estou resistindo e cheguei ao terceiro ano do curso. Muitos dos meus amigos desistiram da faculdade. Outros que não optaram pelos estudos sofrem com problemas de bebida e de drogas que cresce na comunidade indígena”, lamentou o estudante, que hoje trabalha na área de assistência social na Reserva. “Não adianta criar apenas cotas para o ingresso do índio na universidade. É preciso dar apoio para evitar evasão escolar”, afirmou.

A educadora Cristiane Machado confirma que a educação é um pilar transformador de vida. Professora na Reserva, ela disse que o ensino universitário mudou a sua realidade, mas questiona que poucos conseguem a oportunidade. “Precisamos de políticas públicas para garantir a presença do índio na educação”, cobrou a indígena.

O Guarani Silvano Duarte, do Conselho Indígena de Segurança, ocupou a tribuna da Câmara para reivindicar soluções urgentes para problemáticas relacionadas à violência, à álcool e drogas, muito presente na comunidade. “Temos muitos problemas, precisamos de soluções para resolver a uma série de questões”, pontuou.

Problemas a comunidade indígena tem de sobra. Embora a Reserva seja urbana, localizada ao lado de bairros de classe média, condomínios de luxo e de chácaras, sofrem com a falta de serviços básicos, como água encanada, energia elétrica e comunicação – muitos pontos não pegam sinal de telefone. Vivem num espaço que pouco evoluiu em infraestrutura desde que a Reserva foi criada há um século, muito embora a modernidade seja vizinha dos mais de 15 mil indígenas douradenses.

Comemorações

Desde o início da semana, escolas na Reserva Indígena realizam comemorações sobre o Dia do Índio, uma forma de manter viva tradições e cultura indígena local, cada vez mais esquecida. Hoje haverá celebração na casa do patriarca Guilherme Felipe Valério, 89 anos, um dos indígenas mais idosos da Reserva de Dourados. Ele é da região do Pantanal e está radicado em Dourados desde 1961, por influência do extinto SPI, que remanejou indígenas de suas áreas para aldeias criadas em Mato Grosso do Sul entre os anos de 1915 a 1930.

Fonte: O Progresso