No dia da mulher, Cristiane alerta: ”O país do futebol tem preconceito”
Por Redação Publicado 8 de março de 2016 às 11:39

Atacante da seleção brasileira fala sobre dificuldades sofridas na modalidade ao longo da carreira, comenta o que pode evoluir e cita exemplo americano

Uma frase que entristece, mas mostra a realidade da luta diária da mulher no esporte mais popular do Brasil: ”O país do futebol tem preconceito”.  A constatação é de quem com 15 anos já atuava na base da seleção brasileira. Atualmente atleta no Paris Saint-Germain, da França, Cristiane faz o alerta e diz que há sim um público que considera a modalidade dispensável, modalidade essa que já deu duas medalhas de prata ao Brasil nos Jogos Olímpicos. Mas a luta diária abrange muito mais do que o esporte. Ela afirma que é preciso evoluir e que a cada geração a semente da igualdade deve ser espalhada.

– Vai ver o vôlei e acha um monte de mulher bonita. O vôlei consegue se adaptar. No futebol,  muitas vezes não é nem culpa da atleta porque o clube não uniforme pequeno para dar. São esportes diferentes. Tem o pessoal que é machista sim. Algumas vezes você vê comentários nas redes sociais: ”por que existe o futebol feminino? Isso não serve para nada”. Ele não enxerga que é nosso trabalho para ganhar a vida e ajudar nossa familia. O país do futebol tem preconceito. Não dá para diferenciar porque ela é mulher e não pode dirigir ônibus. É preciso evoluir e passar de geração para geração. O Brasil tem preconceito e é difícil. Poderia dar mais oportunidade para as mulheres darem ideias. Quantas ideias maravilhosas são descartadas – disse Cristiane ao GloboEsporte.com.

Os momentos mais difíceis chegam em uma fase que muitas meninas encaram os maiores medos e inseguranças. Na infância, o caminho começa a ser trilhado. Cristiane encarou essa luta diária. Por muitas vezes, chegou em casa chorando, mas os acontecimentos não a fizeram desistir. Nem mesmo as palavras ofensivas.

– Principalmente quando você é criança. Eu era ofendida o todo tempo. Chegava chorando em casa. Todo dia mandavam lavar louça, Maria- homem. Quando você é adulta, você já guarda. São coisas que eu passei. As pessoas não sabem e acabam falando coisas de mim – declarou.

As barreiras não pararam a atacante da seleção brasileira. E, neste dia 8 de março, dia da mulher, é exatamente esse conselho que ela dá às meninas que buscam um sonho. Não desanimar. Não deixar de lado o objetivo por alguma palavra negativa. Como ela coloca, o preconceito no dia a dia seguirá ocorrendo. A forma de tentar acabar com ele aos poucos é seguir em frente.

– Elas têm que lutar sempre e brigar por aquilo que querem. Preconceito está no dia a dia vai ter, mas não pode desanimar. Colocar uma meta e ir atrás. Sou exemplo disso porque me ofenderam, mas eu fui atrás e tenho minhas conquistas – declarou ela, que está disputando a Copa Algarve com o Brasil, em Portugal.

Confira outras respostas de Cristiane:

Melhorou, mas pode melhorar mais

– No Brasil melhorou um pouco. Poderia estar melhor do que é hoje. Encontramos alguns estados com dificuldade de ter. Encontrar times em São Paulo é mais fácil. Prefeituras querem mais. São Paulo tem as melhores equipes e as melhores jogadoras. Não sei se por causa do preconceito ou porque não vai dar retorno. Antigamente era bem pior. Hoje algumas escolinhas já estão sendo montadas. Alguns locais em São Paulo tem sub-13 sub-15, mas são raros.

Amador na França, mas lucrativo

– Aqui na França tem apoio de grandes clubes, mas ainda não é forte. Três ou quatro times. Montpellier, Lyon, que é o top na Europa. Juvisy,  que é o quarto. Há dinheiro que entra, mas não há mais equips fortes. Não é forte, mas tem um passo a frente do que temos no Brasil. Pagam melhor que no Brasil. Fato. Não é profissional, é considerado amador.

Observação de modelos campeões

Com a seleção, demorou muito tempo para algumas coisas mudarem. Poderia estar melhor. Mesmo com título e medalha achamos que seria mais acelerado. Teve enrolação. Se pegar a França está até na frente da gente no ranking. Não tem muito que fazer. Não é feio isso. Pegar o que dá certo.  Porque os Estados Unidos são top, elas têm top salário. Pega como modelo uma equipe que é campeã. Tem que ter boa vontade. Não adianta falar que deu tudo e você não ganhou. Agora não vou dar mais.” Não é assim. Tem que continuar insistindo e continuar investindo e cobrar mais. O Japão e um exemplo – campeão mundial em 2011. China vai crescer muito. Antigamente era e vai voltar a ser. Seis meninas (brasileiras) foram para lá. É triste os outros lugares investirem e evoluírem e nosso país parado.

O futebol feminino no Brasil pode evoluir mais?

– Não sei se tenho esperança de mudar. Pediram medalha e demos. A desculpa era que não tínhamos medalha e demos. Não sei se o ouro vai mudar muito. Eu quero ganhar e ter depois quando parar a alegria de ter mudado a modalidade e ter dado esse passo e ser uma honra para a modalidade. Sem falar caramba batemos duas vezes na trave.

Futebol masculino x futebol feminino: igualdade 

– Vai da escola de cada um. Eles não fazem distinção (nos Estados Unidos). Elas fazem comercial, propaganda quando vão jogar. É muito do lugar e sabe que aqui não tem isso. Sempre tem essa separação e lá fora não. No quadro de medalhas, os americanos estão sempre na frente. Eles investem. É difícil mas não é impossível. Nos Estados Unidos, elas mudaram a modalidade. Uma jogadora falou para mim: “Por que vocês não se reúnem e fazem como nós, nós nos reunimos e dissemos que nao íamos jogar se não mudassem. Essa ideia nos já tivemos, mas parte da atleta. Mas se tivessem se unido teríamos feito barulho.

Fonte: Ge