Aos nove anos, a má influência de alguns “amigos” e a oportunidade de ganhar dinheiro fácil fizeram com que Josiel Trindade de Abreu participasse de um assalto e se envolvesse com o mundo das drogas. Mas, quatro anos depois, a paixão por Cláudia Margarida fez com que ele se afastasse das más companhias e mudasse de vida, completamente.
Hoje, aos 22 anos, Josiel é mais conhecido pelo nome artístico, MC Jota, e, além de se dedicar a esposa e ao filho Gabriel, de 8 anos, também tenta mudar a realidade da juventude campo-grandense que se envolve com drogas e com crime para ter acesso a dinheiro de uma maneira fácil ou para esquecer problemas familiares.
Anos depois de se livrar das drogas, MC Jota passou a compor canções que abordam situações reais de sua infância e também da atualidade. Tomado pela inquietação por testemunhar a morte de seus amigos de infância e ver crianças, que assim como ele, usam drogas aos oito, nove anos, Josiel busca, por meio da música, transmitir a mensagem de que o crime não compensa.
ZONA NORTE PEDE PAZ
MC Jota contou à reportagem do Portal Correio do Estado que compõe música há cinco anos, mas uma delas ganhou clipe e repercussão não esperados pelo artista. A canção que leva o nome “Zona Norte Pede Paz” foi escrita um dia depois de Josiel perder um amigo de infância, morto a facadas, por vingança.
Pedro Henrique de Souza Prado, 21 anos, foi morto em 10 de julho de 2016. Ele estava num campo de futebol, quando autores chegaram no local, o seguraram e o esfaquearam. A execução foi motivada por vingança, já que Pedro teria assassinado um familiar do jovem que o matou.
De acordo com MC, somente no ano passado, na região norte de Campo Grande, entre amigos e conhecidos de infância, 20 pessoas foram mortas em troca de tiros com a polícia, acerto de contas entre desafetos ou envolvimento com drogas.
“A ideia da música Zona Norte Pede Paz surgiu de uma história real. Perdi um amigo que conhecia desde pequeno, estudamos juntos. Um dia depois da morte escrevi a música e o roteiro foi baseado nessa história, lembrando o tempo que a gente andava junto”, comentou, explicando que todo material foi apresentado à equipe do Studio IDVFX, que abraçou a proposta e os planos então foram colocados em prática.
Ao todo, foram dois meses de gravação, em especial, aos sábados e domingos. Mais de 70 pessoas participaram do clipe, incluindo amigos do Pedro Henrique, o garoto assassinado. “Foi tudo novidade porque eu canto há cinco anos e tenho vários trabalhos que só falam de realidade, mas esse é meu primeiro clipe”, revelou.
O clipe conta com a participação especial da rapper LiaLiu, que é irmã do MC Jota. “Ficou bem legal com a participação de uma mulher”, comentou, ressaltando que ficou impressionado com a repercussão do trabalho. Ele conta que publicou o vídeo em seu canal do Youtube no sábado (18) pela manhã e à tarde já havia sido visualizado mais de 800 vezes. Hoje, mais de duas mil pessoas já assistiram ao clipe.
Questionado sobre o resultado do trabalho: “Me emocionei. Eu não esperava que ficasse tão bom, me emocionei quando vi as crianças jogando bola porque lembrei de todo meu passado. Quando estava gravando o clipe eu não tinha ideia de como ficaria porque durante as gravações o clima era de brincadeira, mas quando vi pronto, percebi que ficou muito profissional e mostra exatamente o que aconteceu”, comentou MC Jota.
VIOLÊNCIA
Segundo Josiel, pelo menos 60% de seus amigos do tempo de escola foram mortos, presos ou viciados em drogas. Ele acredita que a dificuldade financeira, a falta de atrativo e a desestrutura familiar são fatores que contribuem para elevar o índice dessa estatística negativa.
“Garotos com 10, 12 anos não querem estudar e nem trabalhar. Para ganhar dinheiro fácil e esquecer dos problemas na família, como agressão dos pais e alcoolismo, entram para o mundo das drogas. Na região também não tem opção de lazer, falta atração e incentivo às crianças. Sem ter o que fazer, a gurizada vai para a porta das escolas usar drogas”, alertou o jovem artista.
Josiel tem 10 irmãos e, quando criança, tinha pai alcoólatra e, por pouco, quase fez parte de desfavorável estatística, que hoje tanto luta para mudar. “Com nove anos eu usava droga e fui incentivado a assaltar para ganhar dinheiro. Minha mãe queria me mandar para São Paulo, mas aos 13 anos conheci a Cláudia, que hoje é minha esposa. Me afastei das más companhias e fomos morar na fazenda. Aos 15 nasceu meu filho Gabriel e eu já era responsável por ele e minha esposa”, relembrou.
Assim como Josiel, outras pessoas de sua família também usaram drogas por algum tempo, mas conseguiram parar com o vício, se casaram e hoje são cidadãos de bem.
“Como trabalho com música, faço shows em casas noturnas aos finais de semana e vejo muita coisa errada. Isso me motiva a querer mudar essa realidade. Em todas as músicas que faço busco passar uma mensagem de mudança e de paz para mostrar para a gurizada que o crime não compensa. São dois os caminhos: a morte ou a cadeia. Eu aconselho a estudar, a trabalhar, mas muitos já pensam que ser bandido é uma profissão”, lamentou.
Fonte: Correio do Estado/Vânia Santos