
Regime reforça ofensiva em Aleppo, e líderes pressionam cooperação de Bashar al-Assad
AMMAN, Síria — Horas após EUA e Rússia terem anunciado um acordo de cessar-fogo para a Síria, previsto para entrar em vigor na noite de segunda-feira, ataques aéreos conduzidos por aviões atingiram neste sábado um mercado movimentado na região de Idlib, que é controlada pelos rebeldes. Pelo menos 25 pessoas morreram, incluindo crianças e mulheres, enquanto outras dezenas ficaram feridas, segundo moradores locais e equipes de resgate. Em Aleppo, houve intensos confrontos quando o Exército sírio atacou áreas controladas por rebeldes, tentando maximizar suas recentes conquistas antes de uma nova trégua. Insurgentes afirmaram estar planejando uma contra-ofensiva na localidade, que vive uma espiral de violência e um drama humanitário.
Em Idlib, dois funcionários da Defesa Civil disseram que corpos ainda estavam sendo retirados dos escombros de prédios que colapsaram na capital da província. Já um morador e um socorrista acreditavam que os aviões fossem das forças russas, já que voavam alto — ao contrário dos helicópteros sírios, que costumam voar mais baixo.
No mesmo dia, o Exército e milícias pró-governo avançaram da área de Ramousah, em Aleppo, aos redutos rebeldes do distrito de Amriyah. A informação foi confirmada por ambas as partes.
— Os combates estão deflagrando em todas as frentes do Sul de Aleppo mas os confrontos em Amiryah são os mais fortes — afirmou o porta-voz militar dos rebeldes.
O Observatório Sírio para Direitos Humanos (OSDH) afirmou que aviões — que, acredita-se, são sírios ou russos — também atingiram áreas rebeldes no Norte de Aleppo. Os ataques atingiram importantes rotas para o transporte de suprimentos dos insurgentes. A organização com base no Reino Unido também confirmou os relatos de que helicópteros do Exército sírio derrubaram bombas de barril em áreas residenciais de civis.
Na sexta-feira, o secretário de Estado americano, John Kerry, anunciou que o país e a Rússia chegaram a um acordo e que deverão anunciar um plano para reduzir a violência na Síria e levar à paz e à transição política. Pelo pacto, um novo cessar-fogo deverá começar na segunda-feira e valerá para todo o país. E, neste sábado, o regime síriou aprovou o pacto, prometendo um cessar-fogo em Aleppo.
Como principal destaque do pacto, os dois lados indicaram que devem chegar a uma cooperação militar contra o terrorismo. O anúncio foi feito após longas reuniões durante o dia com o ministro do Exterior da Rússia, Sergei Lavrov, em um hotel de Genebra.
— Hoje, Estados Unidos e Rússia anunciam um plano pelo qual, esperamos, se poderá reduzir a violência e o sofrimento, e retomar o caminho para uma paz negociada e uma transição política — declarou Kerry ao lado de Lavrov. — A cessação das hostilidades pode ser um ponto de mudança na guerra.
Washington e Moscou, que há cinco anos apoiam lados opostos em conflito que já deixou mais de 290.000 mortos e milhões de deslocados, tentam reativar o plano de paz do final de 2015 elaborado pela comunidade internacional, que inclui uma trégua duradoura, um esquema de ajuda humanitária e um processo de transição política entre e a oposição moderada.
Reativar o processo de paz é crucial para a situação humanitária em Aleppo, que se degrada dia a dia, principalmente após o cerco estabelecido pelas forças do regime.
PRESSÃO A DAMASCO
Já neste sábado, a Turquia celebrou o pacto firmado entre EUA e Rússia. O governo turco afirmou que está se preparando para fornecer ajuda humanitária a Aleppo, em uma ação conjunta com as Nações Unidas. O país, que conduziu sua primeira grande incursão militar na Síria há pouco mais de duas semanas, prometeu também apoiar os esforços para garantir que a trégua se mantenha e transformar o acordo em uma solução política de longo prazo.
O maior grupo de oposição na Síria disse esperar que o novo pacto entre Moscou e Washington diminua o sofrimento dos civis, embora tenham recebido a notícia da trégua com cautela. À Associated Press, o representante do Alto Comitê de Negociações (ACN), Basma Kodmani, afirmou que o governo russo deve pressionar o presidente sírio, Bashal al-Assad, a respeitar o recente acordo.
— Damos as boas-vindas ao acordo, se é que vai ser aplicado — afirmou Kodmani.
O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, Boris Johnson, pediu no sábado que a Rússia use toda a sua influência para garantir que o governo sírio cumpra suas obrigações no acordo diplomático.
— É vital que o regime em Damasco agora cumpra suas obrigações. Eu peço que a Rússia use toda a sua influência para garantir que isso aconteça. Eles serão julgados pelas suas próprias ações — afirmou Johnson.
Segundo Kerry, a trégua irá requirir acesso a todas as áreas ocupadas e de difícil acesso, como Aleppo. O processo terá importância para o futuro próximo da Síria, ele afirmou.
— Todas as partes envolvidas no conflito mostraram interesse em voltar à mesa de negociações — disse ele.
Lavrov afirmou que os acordos estão delineados em cinco documentos que dão conta de temas como cooperação contra grupos terroristas combatidos pelos dois países, esforço por ajuda humanitária e a retomada nos mesmos termos da trégua anunciada em fevereiro e que fracassou após poucas semanas.
Apesar de disputas durante a semana por divergências, Lavrov disse que seu país está convicto de uma retomada das conversas de paz congeladas após um fracasso nas negociações entre setores do governo de Bashar al-Assad e a oposição.
— O acordo pode ajudar a expandir a luta contraterrorista e a entrega de ajuda humanitária para civis — disse Lavrov, afirmando ter o apoio do aliado Assad na decisão.
O secretário de Estado americano destacou que “se a trégua puder ser mantida por uma semana, abrirá caminho para uma cooperação entre as forças militares de EUA e Rússia visando combater os extremistas islâmicos”. Moscou havia feito uma proposta semelhante anteriormente, mas Washington tinha receios.
— Os Estados Unidos acreditam que a Rússia e meu colega (Lavrov) têm a capacidade de pressionar o regime de Assad para deter este conflito e sentar na mesa de negociações para se obter a paz.
Se o plano der certo, será estabelecido um centro de implentação conjunta para compartilhar dados e atacar o Estado Islâmico e a frente Fateh al-Sham (ex-al-Nusra, que deixou de ser filiada à al-Qaeda). Para isso, a Rússia deverá persuadir Assad a parar de bombardear áreas de grande densidade populacional. Já os EUA deverão garantir que os rebeldes que apoia se separem em definitivo de grupos radicais.
Fonte; O Globo