Fim de desonerações divide opiniões de empresários e é bem-visto por analistas
Por Ariel Moreira Publicado 30 de março de 2017 às 23:00

O fim das desonerações anunciado pelo governo federal para equilibrar as contas públicas foi criticado por alguns setores empresariais, mas bem-visto por outra parte dos empreendedores e analistas.

Em vigor desde 2011, a desoneração da folha de pagamento atualmente beneficia 56 setores da economia, que pagam 2,5% ou 4,5% do faturamento para a Previdência Social, dependendo do setor, em vez de recolherem 20% da folha. Com o fim da isenção para quase todos os setores beneficiados, o governo espera arrecadar R$ 4,8 bilhões apenas este ano.

O governo também acabará com a isenção de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para operações de crédito das cooperativas, medida que deve render R$ 1,2 bilhão em receitas.

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Valente Pimentel, a desoneração da folha de pagamento é “altamente nociva” para o setor. “Prejudica o custo de abastecimento local, a competitividade internacional e a geração de caixa para retomada dos investimentos”, disse o executivo à Agência Brasil.

Segundo Pimentel, a redução da carga tributária era uma forma de corrigir a oneração excessiva dos setores intensivos em mão de obra. “O nosso setor tem uma concorrência insana externa e interna. Nós vamos jogar mais uma carga de custos das empresas, que já vêm fragilizadas e debilitadas”, criticou.

Para o represente do setor têxil, a medida não condiz com outras ações do governo. “Em um momento em que o governo apresenta um Refis [parcelamento especial de dívidas com a União] para melhorar as condições de fluxo de caixa, ele aumenta o custo empresarial das empresas que permaneceram no vermelho”, analisou.

Além do fim da desoneração da folha de pagamento, que afetará diretamente as empresas do setor, Pimentel disse que a mudança em relação ao IOF atingirá os pequenos empreendedores que compram de cooperativas. De maneira geral, o executivo estima que as altas de tributos vão elevar os custos das empresas em até 2% da receita bruta.

A Federação do Comércio de São Paulo (FecomercioSP) também “não vê com bons olhos” o fim das desonerações, segundo o assessor técnico da entidade, José Lázaro de Sá. “Primeiro, porque o impacto econômico do ajuste fiscal que o governo vem defendendo é insignificante perto da pressão que ele acaba impondo à categoria produtiva, que acaba sempre suportando a recessão econômica”, ressaltou.

Sá disse que apesar de não ser impactado diretamente, o varejo também deve sentir os efeitos negativos da alta tributária. “Essa medida do governo nós entendemos que ela é inoportuna. Ela gera uma instabilidade, porque vai na contramão da proposta de desburocratização para destrancar a atividade econômica e impacta no comércio varejista.”

O presidente da Associação Comercial de São Paulo, Alencar Burti, avalia que o fim das desonerações “vai retardar a recuperação econômica brasileira”, que está em recessão. “A medida tem o mesmo efeito de um aumento de imposto”, destacou. Burti ponderou, no entanto, que entende as razões que levaram o governo a reverter as desonerações. “Pode até ser correta porque corrige uma distorção gerada por uma decisão tomada no passado, mas está sendo aplicada num momento inoportuno, devido à situação da economia e do emprego”.

Medida necessária

O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, defendeu as medidas. “O bom senso prevaleceu, e optou-se por contingenciar recursos do Orçamento, pela receita de concessão de ativos da União e por promover a isonomia na forma de recolhimento de algumas contribuições e impostos. Foi uma medida sensata e responsável, que evita um mal maior”, disse, em nota enviada à imprensa.

Economistas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec) também avaliam que a suspensão das desonerações para cerca de 50 setores da economia era a opção para melhorar a situação fiscal com menor impacto negativo para a sociedade.

Para o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV) Manoel Pires, o governo precisou corrigir uma avaliação errada feita no ano passado, quando o Orçamento foi encaminhado ao Congresso com a previsão de 1,6% de crescimento em 2017. A expectativa de variação do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano foi revisada para 0,5%, e o desempenho mais modesto da economia gerou menos arrecadação para o governo. Além disso, segundo Pires, o governo encaminhou a Lei Orçamentária contando com receitas incertas que precisaram ser revistas, como previsões otimistas com concessões à iniciativa privada.

“Havia uma percepção de que muitos dos problemas na economia tinham a ver com a mudança do governo, e que com a mudança se poderia gerar um ciclo de confiança e voltar a crescer. O problema é que a gente tem questões estruturais, como alavancagem e a crise dos estados, que mostraram que não é só uma questão de confiança”, disse o especialista em economia aplicada, que considerou adequada a suspensão das desonerações. “Eu diria que, das opções que o governo tem, o fim da desoneração é que a parece trazer menor impacto negativo. As outras opções seriam, por exemplo, aumentar o IOF em um mercado de crédito bastante prejudicado e que não sinaliza recuperação.”

Apesar disso, Pires diz que o governo poderia ter sido mais “arrojado” e suspendido a desoneração de todos os 56 setores. A medida anunciada ontem (29) pelos ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do planejamento, Dyogo Oliveira, poupa o transporte rodoviário coletivo de passageiros, o transporte ferroviário e metroviário de passageiros, a construção civil e obras de infraestrutura e a comunicação. O economista da FGV destaca que as medidas ainda podem ser suavizadas no Congresso e, por isso, poderiam ter ido além.

“Me preocupa um pouco a questão do médio prazo. Muitas receitas que o governo inclui no cenário fiscal são pontuais, entram neste ano e não nos próximos. O contingenciamento não é sustentável por muito tempo, não se consegue adiar essas despesas indefinidamente. Me parece que, para essa confiança [do mercado] ser atingida, é preciso se engajar em medidas mais estruturais”, ponderou.

Fonte Agência Brasil